quinta-feira, 3 de abril de 2008

Último trem




Você sabe qual é a melhor coisa que essa tal de internet fez por nós? Resposta: tirou o fardão da literatura. E mais, há dez anos, pra ler um texto de alguém, tinha que ter um fax ou recorrer ao velho correio. Papel. Tempo. Grana.
Agora a gente coloca aqui o texto e o mundo inteiro lê. Quem dera!
Mas aí vai o que pode ser chamado de prólogo do próximo livro. Esclareço aos interessados que não gosto de rótulos. Não sou um escritor de romances policiais. Sou, ou acho que estou chegando lá, um escritor, um contador de histórias, como os antigos “aedos”. Então às vezes rola uma policial, outras vezes não. Aposto no bom texto, na boa levada. Se conseguir divertir um número razoável de pessoas, vou me sentir recompensado. Afinal dá um trabalho danado colocar as idéias no papel. O próximo livro, tem o título provisório de "Ultimo trem". Como gosto de dizer, as paredes já foram levantadas, agora estou cuidando do interior, da decoração. É nesse momento que preciso de "feedback". Por isso vou colocar o tal prólogo. Se alguém quiser fazer algum comentário, pode ficar à vontade. Pode ser por email, sei que comentar aqui é chato paca.
Então aí vai...



O c o m e ç o d o f i m

A moça olha para o relógio, ansiosa, ainda tem que esperar. Prende o chiclete nos lábios e tenta produzir uma bola. Fracassa. Espia através da pequena grade que a mantém protegida e ao mesmo tempo distanciada da rua. Ergue-se um pouco da cadeira e vê a rua vazia, molhada e fria. Não um frio térmico, apesar do outono faz calor, mas uma sensação de frio circunstancial.
Passos se aproximam da pequena grade e a cabeça raspada a navalha de um rapaz aparece do outro lado da grade.
— E aí? — Pergunta impaciente.
— Tem quinze minutos ainda. Espera. — Ela faz um gesto com a mão, que mais do
que as palavras revela seu ânimo.
— Caraca, não vem ninguém, diz logo lá ao velho que já era. A gente vai se atrasar.
— André, espera tá bom. Eu não posso sair antes, quando derem oito horas eu saio.
Eu prometi e não vou sair antes.
O rapaz afasta-se irritado, praguejando.
A moça tira da bolsa um espelhinho. Olha a franja que começava a perder a cor amarela, revelando fios marrons e pretos. Retoca o batom, ajeita o brinco novo e mais uma vez repete o ritual que vinha fazendo há uma semana: olha o relógio, espia a rua e como nos outros dias, não vê nenhuma alma viva.
Faltavam cinco para as oito, quando desiste de esperar. Sai do pequeno cubículo, tranca a porta, um hábito de quase três anos, e dirige-se a uma outra sala. Bate na porta e entra.
O velho sentado diante de uma antiga e caótica escrivaninha, segura o cachimbo apagado a meio caminho da boca, olha na direção dela, mas seu olhar vaga perdido em um outro tempo, resgatando momentos fugazes de alegria e esperança.
— Seu Fabiano.
Ele estremece na cadeira e a coloca em foco, com um sorriso que não disfarça
sua ânsia.
— Então? — Pergunta com falsa esperança.
— Ninguém. Posso fechar?
Ele aquiesce com um gesto quase imperceptível.
A moça abaixa a cabeça e recua até a porta. Não se importava com o fato em si,
arrumou outro emprego e já começa na próxima semana, mas a visão daquele homem derrotado a emociona.
Antes de sair volta-se e os dois se olham sem ter o que dizer.
— O senhor quer que eu avise ao Miguel?
— Pode deixar eu falo com ele. Obrigado.
— Seu Fabiano. — Disse de cabeça baixa.
— Sim?
— Deus lhe pague e boa sorte. — Sai sem olhar para ele.
Fabiano fica olhando para a porta sendo fechada lentamente. Uma imagem morta
que de certa forma representava tudo naquele momento.
Deixa o pescoço pender para a esquerda e uma lágrima escapa pingando em seu ombro.

Isso é tudo pessoal...

Um comentário:

Unknown disse...

E aí tio, gostei do inicio, só que "caraca", mesmo que a história se passe no rio eu acho que não pega muito bem. No mais eu gostei, to esperando o resto.