Aniella conta como é a vida na pensão, onde se juntam
várias moças, todas cheias de sonhos e esperança, como ela diz: “Não tem diferença
nenhuma dessas pensões pra estudantes, imagino. São os mesmos sonhos e desejos,
ser alguém na vida. O que muda é que enquanto elas, as estudantes, recebem
conhecimento e educação, nós, as prostitutas, damos o pouco que temos,
principalmente a saúde”.
Diante da pergunta de como é o dia a dia na pensão,
Ane muda de expressão e deixa transparecer a menina, como se recuperasse
aqueles anos roubados.
“Todas consideram estar em um lugar transitório, em
um momento de passagem para a sonhada liberdade e uma vida justa e tranquila.
Vivemos das boas lembranças que conseguimos preservar apesar de tudo. Nossas
vidas cabem dentro de caixas de sapato, velhas bolsas, caixinhas de música, um
pé de meia. São as reminiscências do passado ainda tão próximo e vivo,
intimidades escondidas, que nas horas de desespero visitamos, para lembrar que
já existiu uma outra vida. E então confirmar que é possível reconquistar”.
Quem acrescenta é Bárbara, uma novata de quem é
impossível saber a verdadeira idade. Um corpo jovem que se desfaz rapidamente,
transbordando mágoa e ressentimento:
“O pior, amigo, é acordar de manhã e esperar a hora
em que os animais aparecem doidos pra mostrar que são mais fortes e que a gente
não passa de lixo, onde podem cuspir e botar toda a sujeira deles”.
Gabriela, a mais velha de todas, “cinquenta e dois
anos, com muito orgulho e tesão”, se apresenta, ri com vontade de Bárbara. Fecha
essa conversa com uma fala surpreendente:
“Não sei do que elas se queixam, todas tem uma vida
boa e estão aqui porque querem. A porta está sempre aberta. Mas sabe por que
não vão? Eu sei, porque não fui. Porque não vão achar nada lá fora, a família
chutou, botou pra fora. Os amigos fingem que não conhecem. Os vizinhos riem e
viram a cara. Aqui, pelo menos, de vez em quando alguém nos dá o que nunca
tivemos; carinho e atenção. Mesmo quando dói”.
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